Homologado na Justiça, acordo com empregadora prevê pagamento de verbas rescisórias e indenização a grupo de imigrantes paraguaios e menores de 18 anos
O Ministério Público do Trabalho em Mato Grosso do Sul (MPT-MS) conseguiu regularizar o pagamento de verbas rescisórias a 15 trabalhadores resgatados, em dezembro do ano passado, em situação análoga à de escravo na zona rural do município de Nioaque, a cerca de 180 quilômetros da capital Campo Grande.
O grupo irá receber, da então empregadora, uma agropecuarista, as verbas rescisórias relativas à contratação para limpeza de um pasto. Cada trabalhador resgatado também irá embolsar outros R$ 5 mil, a título de indenização por danos morais. Somada, a reparação a ser paga pela agropecuarista, que é arrendatária da fazenda onde os trabalhadores foram resgatados, soma cerca de R$ 150 mil.
O ressarcimento é resultado de ação civil pública, protocolada pelo procurador do Trabalho Odracir Juares Hecht, em face da empregadora. O pagamento, bem como o cumprimento de 18 obrigações de fazer e de não fazer, foi homologado em audiência de conciliação, mediada pela juíza Erika Silva Boquimpani, da Vara do Trabalho de Jardim, realizada no dia 18 de agosto.
O acordo convencionado prevê que o pagamento será realizado em cinco parcelas, a serem depositadas em Juízo, a contar de setembro, e repassado para contas individuais informadas pelas vítimas.
Além de solucionar a grave lesão à dignidade dos trabalhadores, a agropecuarista comprometeu-se a cumprir 18 obrigações de fazer ou de não fazer, sob pena de diferentes sanções, inclusive multa por empregado que venha a novamente ser prejudicado (leia no final deste texto).
Condições degradantes
Os 15 trabalhadores foram encontrados na fazenda em condições análogas à escravidão no dia 4 de dezembro do ano passado. Peritos em Engenharia de Segurança do Trabalho do MPT, auditores-fiscais da Superintendência Regional do Trabalho, Ministério Público Estadual e Polícia Civil estiveram na propriedade e constaram a realidade degradante na qual eles se encontravam, além de outras irregularidades.
Recrutado nas pequenas cidades de Bela Vista e Jardim, no interior de Mato Grosso do Sul, e em Bella Vista Norte, no Paraguai, o grupo era composto majoritariamente por imigrantes de origem paraguaia, dentre eles menores de 18 anos de idade. Conforme registros desta força-tarefa que atuou no resgate, além de robustos depoimentos prestados pelos próprios empregados, eles laboravam sem condições básicas de higiene e segurança, ou registro formal.
Para completar, ficou ajustado o pagamento de parcos R$ 60 por dia pelo labor exercido de segunda-feira a sábado, das 5h30 às 11h e das 13h às 16h30, que deveriam ser acertados ao final do mês.
No processo, o procurador Odracir Hecht também detalhou as condições precárias e aviltantes às quais o grupo era submetido. “Os trabalhadores resgatados, entre eles menores de idade, foram forçados a viver em barracos de lona, numa estrutura totalmente improvisada em um curral, dormindo em camas feitas com tábuas e fazendo suas necessidades fisiológicas num buraco, ou então no mato, não tendo ainda acesso a qualquer material de prestação de primeiros socorros, entre outras irregularidades”, descreveu.
Antes de ingressar com a ação civil pública, o MPT e a Superintendência Regional do Trabalho, em tratativas com o advogado da agropecuarista, buscaram viabilizar o pagamento voluntário das verbas rescisórias devidas. Porém, as primeiras negociações restaram frustradas, já que, apesar de notificada e ciente dos trâmites investigatórios, a ré não compareceu à audiência administrativa inicial designada pelo MPT, assim como não quitou os valores apurados pela fiscalização.
Ainda no acordo homologado pela Justiça do Trabalho no dia 18 de agosto, além da reparação financeira aos trabalhadores, a agropecuarista comprometeu-se a cumprir as seguintes obrigações de fazer e não fazer, fixadas pelo MPT-MS com base nas irregularidades identificadas pela perícia técnica da instituição e auditores-fiscais do Ministério do Trabalho.
– não mais contratar empregados sem o devido registro de trabalho;
– não contratar menores de 18 anos de idade para realização de atividades insalubres;
– não contratar menores de 16 anos de idade, tanto para realização de atividades insalubres, quanto para realização de qualquer atividade alheia à aprendizagem;
– realizar exames médicos admissionais;
– fornecer, gratuitamente, equipamentos de proteção individual;
– não manter empregados trabalhando sob condições contrárias às disposições de proteção ao trabalho, e reduzidos à condição análoga à de escravo;
– disponibilizar alojamentos e acomodações adequadas;
– disponibilizar instalações sanitárias;
– disponibilizar local adequado para o preparo de alimentos;
– disponibilizar local adequado para refeições;
– cumprir os dispositivos relativos ao material necessário à prestação de primeiros socorros;
– fornecer roupas de cama adequadas às condições climáticas locais;
– disponibilizar lavanderia;
– elaborar e cumprir o Programa de Gestão de Segurança, Saúde e Meio Ambiente do Trabalho Rural (PGSSMATR);
– atender às exigências para a concessão de seguro-desemprego e o pagamento do abono salarial, nos termos e prazos fixados pelo Ministério do Trabalho;
– pagar tempestivamente as verbas rescisórias;
– depositar corretamente o percentual referente ao FGTS;
– depositar, por ocasião da rescisão do contrato de trabalho sem justa causa, por iniciativa do empregador, importância igual a 40% do montante de todos os depósitos realizados, ou que deveriam ter sido realizados, na conta vinculada durante a vigência do contrato de trabalho, atualizados monetariamente e acrescidos dos respectivos juros.
Referente ao procedimento ACPCiv-0024057-25.2021.5.24.0076
Fonte: Ministério Público do Trabalho em Mato Grosso do Sul